DO SUBLIME

DO SUBLIME
Tradução de Marta Várzeas

terça-feira, 4 de dezembro de 2018


ARCAÍSMOS E NEOLOGISMOS - UMA LÍNGUA EM CONTÍNUO FLUIR



SÚPLICA


Agora que o silêncio é um mar sem ondas, 
E que nele posso navegar sem rumo,
Não respondas
Às urgentes perguntas
Que te fiz.
Deixa-me ser feliz
Assim,
Já tão longe de ti como de mim.

Perde-se a vida a desejá-la tanto. 
Só soubemos sofrer, enquanto 
O nosso amor 
Durou. 
Mas o tempo passou, 
Há calmaria... 
Não perturbes a paz que me foi dada. 
Ouvir de novo a tua voz seria 
Matar a sede com água salgada.

Miguel Torga

MIGUEL TORGA

MIGUEL TORGA

Miguel Torga
Nasceu a 12 Agosto 1907
(S.Martinho de Anta-Sabrosa, Portugal)
Morreu em 17 Janeiro 1995
(Coimbra)





FICHA DE TRABALHO


DOMÍNIO DA EDUCAÇÃO LITERÁRIA




MENSAGEM


Lê com atenção o poema de Mensagem.

Screvo' meu livro à beira-mágoa.


Meu coração não tem que ter.
Tenho meus olhos quentes de água.
Só tu, Senhor, me dás viver.

Só te sentir e te pensar
Meus dias vácuos enche e doura.
Mas quando quererás voltar?
Quando é o Rei? Quando é a Hora?

Quando virás a ser o Cristo
De a quem morreu o falso Deus,
E a despertar do mal que existo
A Nova Terra e os Novos Céus?

Quando virás, ó Encoberto,
Sonho das eras português,
Tornar-me mais que o sopro incerto
De um grande anseio que Deus fez?

Ah, quando quererás, voltando,
Fazer minha esperança amor?
Da névoa e da saudade quando?
Quando, meu Sonho e meu Senhor?



PESSOA, Fernando, 2008. Poesia do Eu. 2.a ed.
Lisboa: Assírio & Alvim (p. 375)


Apresenta, de forma bem estruturada, as tuas respostas ao questionário.

1. Explicita a estrutura do poema, delimitando os diferentes momentos da sua organização interna.

2. Relaciona o estado de espírito do sujeito poético com a forma como é apresentado o “Senhor”.

3. Refere um dos efeitos de sentido produzidos com a repetição do advérbio “quando” ao longo do poema.


OEXP12DP © Porto Editora

MENSAGEM

MENSAGEM

HISTÓRIA TRÁGICO MARÍTIMA

HISTÓRIA TRÁGICO MARÍTIMA

OS LUSÍADAS, DE LUÍS DE CAMÕES




SUBLIMIDADE DO CANTO

® Sendo um poema épico, que celebra a grandeza de um povo, Os Lusíadas recorre a um estilo nobre e sublime e a um tom elevado para elogiar a ação dos heróis.

® São as palavras da poesia a matéria usada para glorificar os feitos admiráveis dos Portugueses. Elas têm o poder de os valorizar, mas também de os divulgar por todo o mundo e de os registar para a posteridade. O poema imortaliza os heróis portugueses e as suas proezas porque perpetuarão a sua fama na memória da humanidade.

® Mas a epopeia enaltece outros aspetos admiráveis da História de Portugal e das Descobertas marítimas. No quadro de ideias do Renascimento, o canto celebra o Homem, que vence os seus limites e se supera, mas também celebra o saber e o encontro entre culturas que a expansão portuguesa proporciona. Festeja-se ainda a própria poesia, que permite esta celebração, e o amor: conhecer, aperfeiçoar-se, relacionar-se com o Outro (outros povos) e poetar são atos de amor.

® Se as vitórias militares e os triunfos no mar pedem um discurso épico para os narrar (“tuba canora e belicosa”), outros momentos, como o amor de Pedro e Inês de Castro ou a reflexão sobre a fragilidade humana (Canto I, est. 105-106), são tratados em registo lírico, o registo adequado para tirar partido do poder das palavras para exprimir sentimentos e ideias tão humanos.

® Camões crê que, se o canto e a palavra conseguem engrandecer o passado, devem também poder contribuir para melhorar o futuro. A época em que o Poeta vive já não é o período glorioso dos Descobrimentos: Portugal está em decadência. Mas Camões crê que Os Lusíadas tem um valor didático e propõe um conjunto de valores cívicos, éticos e culturais que servem de orientação para fazer um país melhor (cf. Reflexões do Poeta). O Poeta chega a dar conselhos de governação ao rei.

MITIFICAÇÃO DO HERÓI 

® Segundo os códigos do género épico, o herói é uma figura de excelência. Oriundo de uma estirpe nobre, distingue-se pelo mérito e pelos seus valores e realiza feitos extraordinários.

® Como o título Os Lusíadas sugere, o herói central da epopeia de Camões é coletivo: trata-se do povo português, que, ao longo da sua história, realizou obras excecionais. Alguns autores veem Vasco da Gama como o herói individual da epopeia: a personagem é certamente o protagonista do plano narrativo da viagem, porém, podemos questionar se Gama tem o brilhantismo e o caráter de exceção necessários para assumir este estatuto.

® Na verdade, mais do que identificar um herói, o poema de Camões define um modelo de heroísmo. O herói corresponde a um ideal humano. Ascende a este estatuto aquele que, pelo mérito, pelas suas virtudes e pelos atos realizados, ultrapassa a sua condição de homem e se eleva a um plano superior. (As reflexões do Poeta ajudam a traçar o modelo de herói.)

® A noção de herói define-se nos domínios ético, cívico, intelectual e militar. Caracteriza-se pois também pelas causas que serve. O herói está ao serviço do rei, de Deus e da comunidade. Bate-se por ideias importantes e nobres e menospreza os valores mundanos do dinheiro e do poder.

® Na definição de heroísmo d’Os Lusíadas confluem ideais renascentistas e medievais. No quadro do Humanismo, que crê nas capacidades e na liberdade do ser humano, o herói é aquele que se revela uma figura de exceção pelo seu mérito e por defender valores cívicos, morais e culturais – os artistas, os pensadores e os cientistas podem alcançar este estatuto. Na aceção medieval, intervêm a vertente guerreira do herói, a sua genealogia, a coragem, o serviço ao rei, à pátria e à religião.

® Na epopeia de Camões, os heróis ultrapassam provações, em terra (em campanhas militares) e no mar, e realizam atos admiráveis. Os portugueses rivalizam com os deuses e saem vencedores neste confronto. A glória que alcançam traduz-se na imortalização do seu nome e da sua fama: o herói supera, pois, a condição de homem comum. Por isso, os navegadores são metaforicamente divinizados na sua união com as ninfas na Ilha dos Amores – tornam-se, deste modo, iguais aos deuses.

                                                                               Manual Entre Nós e as Palavras, 10º ano (Adaptação)